quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O Microsseguro como ferramenta de desenvolvimento econômico e social

Embora a estabilidade da economia tenha trazido junto uma representatividade maior do setor de seguros no PIB, ainda estamos distante do potencial que o país possui. O que estaria faltando para o país acelerar o crescimento do setor?
 São muitas as barreiras, mas entre elas as maiores estão associadas á capacidade de renda da população, a oferta de produtos adequada, as barreiras regulatórias e a boa vontade do governo em criar mecanismos que venham baratear as operações. Mais adiante tentarei detalhar cada uma dessas barreiras. Sob essa perspectiva, o microsseguro assume um papel fundamental para o crescimento do nível de representatividade do setor no PIB.
É inequívoco que a estabilidade econômica propiciou o aumento de renda da população que compõe as classes C, D e E. Se considerarmos que apenas, 29 milhões da população pertence ás classes A e B, principais beneficiadas com a oferta de produtos de seguro podemos depreender o potencial que a inclusão das classes C e D representariam para o crescimento da indústria de seguros.  
Entretanto, existem muitas barreiras para tornar viável a expansão do mercado, via o microsseguro. Entre os desafios que o mercado terá que superar, destaco: (1) Custo da operação; trata-se de uma das principais barreiras a ser removida. Hoje a carga tributária incidente sobre as operações de seguro são elevadas. O IOF sobre o prêmio varia de 0,38% a 7,38% sobre os prêmios. A incidência do PIS-COFINS é de 4,65%, incidente sobre os prêmios recebidos. A CSLL representa 15% e o imposto de renda é de 25%. Tal qual, o seguro, o microsseguro é uma ferramenta para atingir o desenvolvimento econômico, gerando empregos e proteção ao trabalhador.
 Entretanto, sob condições tão adversas é impossível pensar em crescimento do setor. Talvez, a principal iniciativa do governo, apesar de muito criticada é o bolsa família que não deixa de ser uma forma de proteção às famílias de baixa renda; (2) Criatividade na oferta de produtos; as seguradoras têm um grande desafio nesse sentido. Ao longo das últimas décadas teve como foco a oferta de seus produtos para a população das classes A e B. De certo modo, o perfil dessa população já foi estratificado ou depurado pelos gestores de produtos e de marketing que possui conhecimento das demandas desse público, em vista o relacionamento de longa data.
 Mudar esse foco demandará uma mudança de paradigma que não é uma tarefa tão fácil como a princípio se poderia imaginar, pois envolve uma questão cultural. As classes C e D possui características e motivações diferentes e pouco histórico de relacionamento. Hábitos e comportamentos são tarefas fáceis para monitorar e prover respostas em pouco tempo. Entretanto, acredito que a maior barreira seja de caráter psicológico ou cultural, pois existe uma crença por parte desse grupamento da sociedade que, o seguro é coisa complicada. Para tornar mais crítica essa questão, há falta de confiança que o valor da indenização será pago pela Seguradora. Especialmente no caso de seguros relacionados à vida (morte, invalidez e sobrevivência), pois para esse grupamento social, ainda prevalece á imagem dos antigos Montepios que afetou a credibilidade do setor.
Por mais esforço que se faça para não associar aquela realidade à atual, a barreira existe. Também é verdade essa imagem já afetou todas as camadas da população . Há que salientar que as operadoras, conseguiram com relativo sucesso derrubar essa barreira para os grupamentos das classes A e B. (3) Barreiras regulatórias; por mais que a SUSEP tenha desenvolvido uma série de ajustes ao longo da última década no sentido de melhorar o ambiente regulatório, ainda há muito por fazer para criar salvaguardas de modo a proteger o segurado. Para aqueles que tiverem interesse em conhecer o estágio em que se encontra essa questão sugiro consultar o site http://www.susep.gov.br/menuatendimento/microsseguros.asp. Lá poderão encontrar uma análise detalhada do que tem sido feito pelo grupo de trabalho da SUSEP encarregado de adequar a legislação para atender as demandas do microsseguro.
Em vista da população mais pobres não ter acesso ao seguro formal para proteção contra riscos associados a morte do chefe de família, doenças graves, crônicas ou contra a perda de um ativo, incluindo bens associados a plantação, pecuária e habitação o microseguro torna-se mais necessário. A falta de proteção para esse grupamento social torna essa população mais vulnerável e menos capaz de absorver as conseqüências financeiras de um evento dessa natureza, especialmente em um país com tantas desigualdades sociais como o Brasil.
O microsseguro torna-se uma ferramenta importante para inclusão social, tal qual representa hoje outros programas correlatos que deram uma importante contribuição para melhoria de qualidade de vida das classes C, D e E. Refiro-me ao programas das microempresas e de microcrédito.
  Entre as diversas necessidades que poderiam ser objeto seguro, destacam-se: o seguro colheita para pequenos agricultores e fazendeiros contra enchentes e condições adversas do clima para se protegerem contra perda de suas lavouras, ou perda de receitas devidas à queda de preços das commodities agrícolas, tão comuns em economias avançadas; o seguro saúde, em vista das péssimas condições oferecidas pelo Estado que hoje necessita de uma forte presença da iniciativa privada, pois os produtos individuais praticamente se tornaram proibitivos, face, a intervenção do Estado. Os seguros contra perda de emprego e tantos outros.
 Entretanto, gostaria de salientar os seguros de proteção á vida que deveriam ser repensados pelos provedores de seguro. Acredito que os produtos da família PGBL e VGBL possuem custos muitos elevados para serem absorvidos pelas camadas da população mais pobres, além de ter contra si, o fato de impor o risco de volatividade dos mercados para o segurado. Penso que nesse sentido, as seguradoras terão que avançar significativamente na oferta de produtos mais completos.
Acredito que nesse contexto alguns produtos de seguro cumprem essa necessidade, tais como: (1) o seguro de vida inteira que é um seguro vitalício, em que os prêmios são devidos enquanto o segurado estiver vivo, no caso do segurado falecer antes de decorrido o prazo de carência, é devida, a devolução aos beneficiários do saldo da reserva técnica acumulada. Essa modalidade de seguro permite que o resgate do saldo acumulado a qualquer tempo ou após o período de carência estipulado em contrato. A principal característica desse seguro é possuir os prêmios nivelados ao longo do período de pagamento. No início o segurado paga um valor superior ao valor do prêmio de seguro de vida, referente a sua idade, mas em troca os valores dos prêmios de seguro de vida não sofrem acréscimo com o passar dos anos, em razão do aumento do risco da idade. A grande maioria dos produtos de seguros existentes, constituídos em regimes de repartição torna proibitivo, o custo para a população, face ao aumento do risco da idade. É comum, o segurado pagar desde jovem e acabar deixando de contribuir, quando mais precisa, deixando de ter direito a cobertura e, sequer a parte dos prêmios pagos, pois não é constituída reserva matemática ao longo do tempo. (2) cash value dado que é constituída reserva matemática, há no caso de cancelamento da apólice, a possibilidade de existir um saldo a ser recuperado pelo segurado, referente aos prêmios puros pagos, acrescidas de juros menos as despesas incorridas pela seguradora na aquisição e administração da apólice. Além dessa modalidade existem outras opções financeiras que uma seguradora poderia oferecer ao segurado que deseja suspender o pagamento dos prêmios. (3) Seguro de vida temporário; trata-se de um seguro cuja cobertura é oferecida por um período limitado, sendo dada a opção de cumprido o período de cobertura, o segurado poder cancelar a apólice ou continuar pagando, os prêmios para prolongar a cobertura, porém em níveis mais elevados. No caso do segurado falecer ao longo do período, a indenização é paga ao beneficiário indicado. (4) Dotal misto; trata-se de um produto muito comercializado nos países de economias mais avançadas. É um seguro que combina características de um seguro tradicional com cobertura de risco por sobrevivência, na forma de uma espécie de poupança programada, isto é, oferece cobertura contra o risco de morte e, ainda possibilita, o resgate de parte dos valores dos prêmios puros ao final do prazo de cobertura. Trata-se de um produto estruturado na modalidade de benefício definido e no regime de capitalização, tendo como objetivo garantir o pagamento de um capital ao segurado em função da sobrevivência do segurado, conforme o prazo de cobertura em contrato, ou de uma indenização ao beneficiário pelo falecimento do segurado, durante o prazo contratado. O dotal misto tem como característica principal a formação de uma poupança programada, pois em qualquer circunstância o segurado poderá dispor do montante da reserva matemática acumulada ou no momento que findar o prazo contratado. Existem muitas críticas a esse modelo de plano por representar risco para a Seguradora, mas isso não pode se constituir em uma barreira para deixar de operar com esse produto. Afinal, o risco é a matéria prima do Seguro.
Não podemos esquecer que as taxas de juros de longo prazo tendem a redução no médio e longo prazo e, embora, ainda, os ganhos de rentabilidade sejam elevados e responsáveis pela maior parte da receita, uma gestão de risco mais eficiente deve ser perseguida pelas seguradoras.

Marco Pontes é diretor da LG&P Advisory Services, membro do IBA e da Academia Nacional de Seguros e Previdência – ANSP. Email: marco.pontes@lgpconsulting.com.br

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